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Mineiro não tem educação, não?

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Assim, perguntou a voz poderosa para ele.

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O ano de 1967 começou sombrio no Brasil. A escolha do ministro da guerra Costa e Silva para suceder Castelo Branco na presidência era um indicativo claro do endurecimento do regime militar, que até ali já havia dissolvido os partidos políticos tradicionais, cassado os mandatos dos principais oposicionistas e acabado de fechar o Congresso Nacional.

Sem espaço para atuação política, a resistência democrática se refugiava cada vez mais nas artes, expressando seu descontentamento nos filmes do Cinema Novo, nas montagens teatrais engajadas e nas músicas populares com temáticas social. Para estas, o palco ideal era o dos festivais, organizados pelas redes de televisão e disputados pelos nomes mais expressivos da MPB, além de um exército de novatos em busca de reconhecimento.

Milton Nascimento era um compositor a mais tentando achar seu lugar nesse cenário musical efervescente, no qual a supressão das liberdades servia ao mesmo tempo para coagir e estimular os artistas. Em junho de 1966, Bituca conseguiu seu primeiro momento de brilho além das montanhas de Minas Gerais ao participar como intérprete no Festival da Tv Excelsior, em São Paulo, defendendo a canção de Baden Powel e Lula Freire, que ficou em quarto lugar. Na noite da apresentação final, ele cruzou num corredor com Elis Regina e, tímido como ele só, baixou a cabeça para não ser percebido pela cantora, a quem havia conhecido de raspão na casa de uma amiga comum, no Rio de Janeiro, meses antes. Mas a Baixinha se lembrava muito bem dele e tomou a iniciativa, segundo relata a jornalista Maria Dolores em seu livro Travessia, a Vida de Milton Nascimento:

- Mineiro não tem educação, não?

As pessoas educadas dizem bom dia quando é de manhã, boa tarde quando é de tarde e boa noite quando é de noite.

Espantado com o reconhecimento, Milton explicou que só queria poupá-la de uma chateação. Elis que já havia decolado na carreira e até vencido o festival anterior, como intérprete de Arrastão, de Edu Lobo e Vinícius de Moraes, não quis saber de desculpas, e foi logo intimando Bituca a visitá-la e mostrar as suas composições, enquanto escrevia o endereço num papel.

No dia combinado, Bituca foi exibindo suas músicas, das mais recentes às mais antigas, sem provocar grandes reações. Já se preparava para ir embora, quando a cantora perguntou se não havia mais nada. Milton se lembrou então de uma canção na qual não botava muita fé, por ainda achar que precisava apurar a melodia. Era a Canção do Sal, que ele compôs ao visitar Cabo Frio (RJ) e testemunhar o difícil trabalho nas salinas da região.

- Essa aí! Vou gravar no meu novo disco - sentenciou a Pimentinha, assim que a ouviu.

Milton levou um susto. Ele considerava a Canção do Sal uma obra inacabada, que esperava por um retoque.

Elis não não pensava assim e gravou a canção.



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Beth Muniz
Minha Coleção Milton Nascimento, Volume 1 - Milton, 1967.
Abril Coleções.

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